6/17/2012

O meu 禅空


zen2Decidi há pouco mais de dois anos buscar o Zen. Escolhi o Zen Vazio - que consiste em limpar sua cabeça através de experiências e arte – influenciado pela história do samurai Miyamoto Musashi.

Sempre fui avesso a dogmas, rotinas e normas, valorizando em primeiro lugar meu empirismo. Por isso, a primeira coisa que resolvi fazer foi… ler! Buscar na vivência alheia elementos que poderia testar em mim. Curiosamente não consultei nenhum livro de auto-ajuda, nem mesmo best-sellers do tipo ‘tem que ler’. Se eu fizesse isso estaria me contrariando. Na verdade os que mais me influenciaram estavam lidos há muito tempo, apenas tive o trabalho de ligar os pedaços com um pouco mais de pesquisa na internet.

Regras definitivamente não são meu forte quando se trata de vida pessoal. Não que eu tenha problemas em seguir regras sociais ou em ambientes coletivos, mas na intimidade a minha conduta sempre foi pautada pelo aprendizado e a busca por um caminho diferente, mesmo que muitas vezes seja mais complicado ou desagradável. Com esse trajeto aconteceu a mesma coisa: logo eu já tinha um patch de conceitos e exercícios desenvolvidos com muita análise do ambiente, montando o meu próprio Zen Vazio.

Não tenho a menor pretensão de doutrinar alguém ou reivindicar pra mim uma cultura estabelecida há anos, apenas compartilhar o (muito) pouco que aprendi e talvez olhar no espelho do ensaio onde estou cometendo erros. Pode ser que os possíveis erros ou contradições que existam aos olhos de quem leia não se apliquem a mim, mas mesmo assim gostaria de que fossem comentados, por favor, entrem em contato. Quem se interessar e quiser me perguntar sobre o Zen proceda da mesma forma.

A primeira reação quando comento sobre o Zen é dizerem que jamais conseguiriam ser assim por que são muito estressados. O Zen não exclui pessoas com pouca paciência e muito menos tem relação com pacifismo. Ele representa equilíbrio e harmonia, portanto, se o ambiente ao seu redor está em desajuste com seu espírito você deverá providenciar balanço, que pode ser de fuga a enfrentamento, e isso vale pra qualquer situação. Depois de muita reflexão essa conclusão me parece um pouco óbvia e até palavras de um irmão me valeram de inspiração no meu conceito: “Justiça não tem nada a ver com perdão”. Se há conflito e sua atitude é pacata fica bem difícil verificar temperança. Um exercício que sempre faço é tentar analisar a situação como se eu não pertencesse, não fosse parte. Se foi causada por mim, o que outro alguém faria em meu lugar? Se um terceiro, será que eu faria o mesmo? Por que será que ele/a agiu assim? Tenho momentos de explosão, mas procuro refletir assim na maioria das vezes. Dedico um bom pedaço nessas considerações antes de optar por qualquer alternativa. Muitas vezes errei ao escolher fuga onde pedia enfrentamento, mas decidir batalhar é mais complexo – qual a medida exata da justiça? “Olho por olho, dente por dente” está registrado em um dos livros mais antigos da humanidade, mas como mensurar o quanto basta? Quanta falta me fará um olho? Será proporcional a quem eu tirar o olho? O que posso dizer é que esse exercício se torna mais dinâmico e eficiente a medida em que é praticado, como levantar peso ou fazer palavras cruzadas. Mesmo assim creio que nunca será totalmente eficaz, nem em um milhão de anos.

Deveria ser clichê a expressão ‘a viagem é mais importante que o destino’, mas não é assim. Sei qual o meu destino, o Zen, e isso é a única certeza que quero para meu futuro, entretanto , não sei quando chegarei, nem se chegarei. Minha convicção é de que cada momento ínfimo representa um cisco dessa trajetória. Aproveito cada situação, cada interação, cada vivência mínima. Não me desespero e busco conservar a serenidade em qualquer adversidade, assim como extrair beleza de tudo que me cerca. Tenho consciência de que felicidade e tristeza são faces da mesma moeda e que cabe a mim joga-la novamente se o lado visto não me agradar. Noto pessoas reclamando da vida pelos mais variados motivos e quase sempre quando faço o exercício de me colocar em seus lugares noto que são auto-algozes que se infligem sofrimento, ou que enxergam penúria onde ela está ausente. Não me iludo com a felicidade, nem tento me enganar ocultando as tristezas, é exatamente o contrário – tenho uma relação de promiscuidade com a primeira e de debate com a segunda. Sei que alegrias não vão se entregar a mim fielmente, muito menos com frequência, assim como sei que maus momentos estarão a espreita. Pensei sobre a tristeza um dia que chovia copiosamente e eu estava esperando o ônibus, todo molhado e com frio. A epifania foi a seguinte “me preocupar, ficar depressivo, irritado ou qualquer coisa assim não vai mudar o clima ou o fato de eu estar molhado, então por que eu vou me aborrecer?” – o pensamento foi tão profundo que um sorriso brotou sozinho em meu rosto e passei a interagir com as pessoas ao meu redor, que também começaram a brincar enquanto eu admirava a beleza da água correndo pela sarjeta. Quanto a alegria, um texto lido dois dias atrás serviu para desenvolver o embrião que germinava no meu inconsciente. Escrito por um grande empresário que é colunista de uma revista alternativa ele versava sobre nossa vã necessidade de celebrar como naturais meras convenções. Aniversários, promoções no trabalho, êxitos duvidosos, tudo vira comemoração, quando na verdade são consequência da vida e do esforço que devemos esperar de cada elemento no universo. Uma formiga ou uma barra de ouro não têm a menor noção de seu esforço ou valor, talvez por isso não precisem tomar prozac ou rivotril, nem se sintam desmotivadas ou não-reconhecidas (com hífen mesmo).

Arte e beleza são itens que permeiam cada polegada do meu ser. Sou atraído por elas a ponto de vê-las fumegarem de tudo. São também fonte de grande controvérsia por parte de quem me pergunta sobre o Zen. O belo e o construído pelo/para o homem são como irmãos xifópagos gerados por mães diferentes. O belo é a simetria existente entre o ser animado e inanimado junto ao que está ao redor. Pra mim parece incongruente admirar uma estátua sobre uma pedra ao mesmo tempo que se coloca desprezo na orgânica relação de um estilo musical e seus ouvintes. Também consegui desvincular o que é belo e o que é repudiado pelo homem, como o espetáculo de uma onda gigante que se torna atrocidade por causar mortes, ou o bailado natural de uma leoa e uma zebra. Na arte levo em consideração seu espaço/tempo. É cansativo e frustrante tentar enxergar beleza onde tua criação e cultura te desenham o feio. Em um simples relance é fácil verificar essa teoria, comprovar como muita gente se faz infeliz e mal ao próximo por não aceitar como arte a criação espontânea do homem. Qualquer artefato humano, ideal ou material, deve ser respeitado. E por artefato leiam música, pintura, imagem, mitos, religião, arquitetura, costume, orientação sexual. Tudo que venha de/para o homem deve ser admirado, no mínimo respeitado. Vale aqui o ditado inglês de calçar os sapatos do outro. Produza qualquer coisa e submeta a avaliação, nesse momento você crescerá como artista e como admirador.

Meditar, refletir, praticar atividade física, ler, escrever, ouvir, falar, aprender e ensinar são verbos essenciais no trajeto. Humildade não deve ser confundido com esconder seus avanços, suas qualidades. Tripudiar com certeza vai te fazer recuar muitos passos, mas sarcasmo pode ser mostra de sensibilidade, porém, como o confronto deverá ser a escolha mais cuidadosa.

Essas considerações foram escritas em uma lufada de ar, apesar de serem fruto de mais de dois anos de reflexão – sim, já pensava nelas antes de afirmar o Zen - com certeza contém falácias, mas elas podem ser verdade para mim, ou meros enganos no caminho. Reafirmo aqui meu desejo de receber algum retorno, positivo ou negativo. Se ficar interessado a ponto de se dispor a ler mais busque no meu twitter (@cordeirogustavo) dois micro-universos: ‘said the old man’ e ‘segue o diálogo’. Said… é sempre uma pequena frase em inglês, e diálogo é sempre um jovem conversando com o mestre.

Um comentário:

  1. "Aquele que sabe amar, suportar e perdoar sempre sai ganhando." - Herman Hesse
    Acabei de ler isso logo após ter lido seu texto. Acho que é por aí... o "sai ganhando" indica uma batalha, ou uma disputa. Reagi mal à primeira leitura, mas depois pensei: de verdade, o que fazemos na vida a não ser batalhar e disputar? Seja pelo livre pensamento e sua manifestação, seja pelo amor de quem amamos, seja pelo bendito pão do dia... essas, as batalhas "do bem". Há quem lute pelo prazer de esmagar, dominar o outro, mas esses é melhor deixar pra lá, e exercer o "perdoar" do Hesse.
    Mas que não se pense que é fácil, a gente bem sabe que não é.
    Nossa humanidade é pautada também pelas pulsões, que todos temos, e nem todas são de vida. Isso talvez explique a auto-flagelação a que você se refere no texto. Importante buscarmos as que nos "empurram" para a busca de uma felicidade, ou de momentos felizes, e barrem o impulso para o sofrimento.
    Gostei do seu texto, não apenas pela forma, mas também pelo conteúdo, e torço muito para que você consiga chegar lá. Não é tão tranquilo se colocar no lugar dos outros, nem se olhar "no espelho do ensaio" e enxergar os próprios erros.
    Penso que nem autopiedade, nem resignação; nem viver a vida dos outros, nem esquecer que há outros; sentimento primeiro, pensamento depois - essa é a ordem. Se dermos atenção a isso, conseguimos um equilíbrio. Se é o que você nomeia de Zen Vazio ou não, não sei. Mas se me chamo Miriam ou Joana, pouco importa, é apenas um nome que me deram, eu nem mesmo pude escolher! ;)
    Beijo!

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